A partir do julgamento da Reclamação 2391/PR, o Plenário do STF passou a reexaminar a constitucionalidade da exigência de prisão para que o condenado pudesse recorrer em liberdade. Embora a referida reclamação tenha sido declarada prejudicada, por perda de objeto, o entendimento que estava a se firmar, pressupunha que eventual custódia cautelar, após a sentença condenatória e sem trânsito em julgado, somente poderia ser implementada se devidamente fundamentada, nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal.
A matéria voltou a ser enfrentada no julgamento do Habeas Corpus 84078-7/MG, relatado pelo Ministro Eros Grau, afetado ao Pleno pela 1ª Turma que, por maioria, concedeu Habeas Corpus, nos seguintes termos:
“Ofende o princípio da não-culpabilidade a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, ressalvada a hipótese de prisão cautelar do réu, desde que presentes os requisitos autorizadores previstos no artigo 312 do CPP” .
Em seu voto-condutor, o ministro Eros Grau deduziu, em síntese, a seguinte argumentação:
(i) os preceitos veiculados pela Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal, artigos 105, 147 e 164), além de adequados à ordem constitucional vigente (artigo 5º, inciso LVII), sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no artigo 637 do CPP;
(ii) quanto à execução da pena privativa de liberdade, dever-se-ia aplicar o mesmo entendimento fixado, por ambas as Turmas, relativamente à pena restritiva de direitos, no sentido de não ser possível a execução da sentença sem que se dê o seu trânsito em julgado;
(iii) a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente poderia ser decretada a título cautelar;
(iv) a ampla defesa englobaria todas as fases processuais, razão por que a execução da sentença após o julgamento da apelação e antes do trânsito em julgado, implicaria, também, restrição do direito de defesa, com desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão;
(v) o modelo de execução penal consagrado na reforma penal de 1984 conferiria concreção ao denominado princípio da presunção de inocência;
(vi) a supressão do efeito suspensivo dos recursos extraordinário e especial seria expressiva de uma política criminal vigorosamente repressiva, instalada na instituição da prisão temporária pela Lei 7.960/1989 e, posteriormente, na edição da Lei 8.072/1990;
(vii) concluiu que, se a Corte, ao julgar o RE 482006/MG, prestigiara o disposto no preceito constitucional em nome da garantia da propriedade, não o poderia negar quando se tratasse da garantia da liberdade.
Após o julgamento do HC 84078-7/MG, ambas as Turmas do STF têm reafirmado a decisão do Pleno adotada no citado Habes Corpus, tendo a ministra Carmem Lúcia votado no mesmo sentido da tese vencedora, ressalvando seu ponto de vista e a ministra Ellen Gracie assentado que “não tendo prevalecido meu posicionamento, curvo-me ao entendimento da maioria”.
Assim, restou consolidada a nova diretriz jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal pela impossibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade decorrente de sentença penal condenatória, quando interposto Recurso Extraordinário e/ou Especial, que são desprovidos de efeito suspensivo, ressalvada a decretação de prisão cautelar nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal, sob pena de se malferir o princípio da presunção da inocência.
Com isso, o Supremo Tribunal Federal conforma a validade da interpretação do artigo 637, CPP com o princípio constitucional da presunção de inocência e as bases democráticas do sistema jurídico nacional ao reafirmar a excepcionalidade da prisão cautelar, que somente deve ser decretada em situações de absoluta necessidade.
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