A Lei Maria da Penha
é constitucional e o Ministério Público pode atuar nos casos de crimes de lesão
corporal contra as mulheres independente da representação da vítima, decidiram
os ministros do Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (9/2). O julgamento
encerrou os questionamentos sobre o conflito dos artigos 1º, 33 e 41 da lei e
garantiu a existência de ações contra os agressores mesmo quando a queixa é
retirada ou não é nem feita pelas mulheres.
O ministro Marco Aurélio votou pela
procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.424, que estava sob sua
relatoria, sendo acompanhado por oito de seus colegas (o único voto contrário
foi de Cezar Peluso). Para o ministro, a proteção que o Estado deve dar às
mulheres ficaria esvaziada caso se aplicasse a Lei 9.099/95, dos Juizados
Especiais, que condiciona a atuação do Ministério Público à representação.
O ministro citou, ainda, que dados
estatísticos demonstram que, em cerca de 90% dos casos, a mulher agredida acaba
renunciando à representação. Muitas vezes, segundo Marco Aurélio, "na
esperança de uma evolução do agressor". O relator ponderou que, na
verdade, o que ocorre é uma reiteração da violência, normalmente de forma mais
agressiva, exatamente pela "perda dos freios inibitórios", uma vez
que a mulher recuou na denúncia.
Constitucionalidade
garantida
Por
unanimidade, a lei que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e
familiar contra a mulher teve sua constitucionalidade decidida com o julgamento
da Ação Declaratória de Constitucionalidade 19, na qual a Advocacia-Geral da
União, representando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pretendeu (e
conseguiu) acabar com as divergências em relação à lei. A ação foi motivada por
diferentes decisões de juízes e tribunais, que, ao julgar casos de violência
doméstica, afirmaram que a lei é inconstitucional.
A ação explica que a lei não tem sido
aplicada em diferentes casos por juízes verem nesta uma afronta ao princípio da
igualdade, garantido no artigo 5º da Constituição Federal, ao tratar de forma
diferente mulheres e homens, uma vez que a lei só se aplica à violência contra
a mulher.
Outro ponto questionado em decisões
judiciais é o artigo 33, que define que as varas criminais "acumularão as
competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da
prática de violência doméstica e familiar contra a mulher", enquanto não
estiverem estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher. As sentenças que definem tal artigo como inconstitucional alegam que o
artigo 96 da Carta Magna diz que cabe aos estados (e não à União) fixar a
organização judiciária local.
O terceiro e último ponto apontado na ADC 19
é o suposto conflito constitucional contido no artigo 41, que destitui a
competência dos Juizados Especiais para julgar o caso.
A ação expõe sentenças dos Tribunais de
Justiça do Mato Grosso do Sul, do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do
Sul que consideraram a Lei Maria da Penha inconstitucional pelos três motivos.
A AGU sustentou que a Lei Maria da Penha, ao
inibir a violência contra a mulher, estaria conferindo efetividade ao princípio
constitucional da igualdade material, ao tratar diferentemente a mulher para
reverter a discriminação sofrida por ela.
A alegação de que haveria
inconstitucionalidade na fixação das varas criminais para julgar os casos
previstos na lei é tida como improcedente, uma vez que, segundo alegação da
AGU, compete privativamente à União legislar sobre Direito Processual, para
conferir tratamento uniforme a determinadas questões, "principalmente as
que extrapolam os interesses regionais dos estados, como o combate à violência
doméstica".
Já em relação ao questionamento da
constitucionalidade do artigo 41, a defesa da AGU alegou que a Constituição
prevê a criação de Juizados Especiais apenas para infrações penais consideradas
de pequeno potencial ofensivo, mas que a violência doméstica não pode ser
considerada dessa maneira. "A violência doméstica contra a mulher tem um
desastroso efeito nocivo à sociedade", diz a ação, justificando que isso
faz dela "um crime de maior potencial agressivo".
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