Por Marcos de Vasconcellos - é repórter da revista Consultor Jurídico.
Em 2003, a advogada Rosana Chiavassa concorreu pela
primeira vez à presidência da seccional paulista da Ordem dos Advogados do
Brasil. Este ano se apresenta novamente, como pré-candidata. Com o discurso de
se aproximar dos advogados, ela foi a primeira a “colocar a campanha na rua”
este ano, organizando panfletagens nas portas de fóruns de São Paulo.
Com passagem na
política partidária pelo PPS, Chiavassa fala claramente sobre negociações na
formação de chapa para concorrer ao mais alto cargo da OAB-SP. “O amigo não
pode existir numa chapa. Tem que ter na chapa pessoas capazes, competentes e
representativas dos segmentos mais significativos”, diz a advogada.
Rosana Chiavassa diz
acreditar que há uma campanha para colocar o advogado como “o grande malandro”,
sempre representado de forma pejorativa na mídia, e que é papel da OAB mudar
isso, para que a classe seja respeitada. Respeitado, o advogado vai defender de
melhor forma a sociedade. Assim, a pré-candidata diz ver a união dos dois
principais papéis da OAB-SP: defender e representar o advogado e defender e
proteger a sociedade.
O advogado, na visão
de Chiavassa, é “vilipendiado” diariamente nos fóruns, aguardando em filas
imensas a abertura de portões, sendo obrigado a aguardar julgamentos por falta
de organização do Judiciário. Violado também está, segundo ela, o mercado de
trabalho, pela lei que criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que, por
exemplo, permitiu à parte se dirigir pessoalmente aos Juizados e proceder oralmente
à sua petição, sem a assistência de advogado.
Os problemas como as
grandes filas ou a disponibilização das pautas de julgamentos online seriam
fáceis de resolver, segundo a pré-candidata. “Basta uma conversa com a
presidência do TJ-SP. Mas quem não conhece o dia a dia do advogado não sabe
falar sobre isso”, diz ela, aproveitando para alfinetar a atual gestão.
Apoiadora
incondicional da atuação do Conselho Nacional de Justiça, Chiavassa defende que
o poder concorrente de tal órgão só se faz necessário pela falta de
transparência das corregedorias regionais. A transparência também é um ponto
que ela levanta ao falar da OAB. Na visão da pré-candidata, o dinheiro
arrecadado pela entidade é como arrecadação pública.
A advogada justifica a
aprovação da Lei da Ficha Limpa sem a necessidade de que processos contra os
políticos transitem em julgado para a inelegibilidade deles com a falta de
dados disponíveis. “Se você me mostrar em um levantamento real que 80% dos
recursos para o Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça são
providos, eu diria que precisamos esperar [o
trânsito em julgado].”
Quanto às eleições
diretas para o Conselho Federal da OAB, do qual Chiavassa já participou, a
advogada se mostra receosa. Por um lado, diz que o eleitor não está
conscientizado o bastante para eleger os conselheiros, por outro, diz que esse
é o caminho certo a ser seguido.
Incomodada com a
situação de advogados com situação financeira ruim, a advogada questiona as
funções da Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (Caasp). “Eu acho
fantástico termos farmácia, remédios, ambulâncias, mas fica a pergunta maior:
Para quê ambulância, se ele não tem plano de saúde? Para quê remédio, se ele
não consegue nem ir ao médico?”
Rosana não é a única
mulher que se coloca como pré-candidata à presidência da OAB, mas exalta a luta
pelos direitos das mulheres ao citar, entre seus ídolos no Direito, Claudia
Lima Marques.
Leia a entrevista com
a pré-candidata.
ConJur — A senhora
poderia falar um pouco sobre chapa, alianças e campanha?
Rosana Chiavassa — Qualquer candidato que diga que está com a chapa fechada já perdeu a eleição. Porque eleição é um caminhar, onde vamos juntando a diversidade de toda a advocacia, e os diversos segmentos para poder ser realmente representativo. Não é à toa que a inscrição das chapas ocorre em outubro. Infelizmente, historicamente muitas pessoas são degoladas [das chapas] da noite para o dia. Dormem conselheiros e amanhecem nada, por conta dessas negociações, embora isso não seja uma prática moral.
Rosana Chiavassa — Qualquer candidato que diga que está com a chapa fechada já perdeu a eleição. Porque eleição é um caminhar, onde vamos juntando a diversidade de toda a advocacia, e os diversos segmentos para poder ser realmente representativo. Não é à toa que a inscrição das chapas ocorre em outubro. Infelizmente, historicamente muitas pessoas são degoladas [das chapas] da noite para o dia. Dormem conselheiros e amanhecem nada, por conta dessas negociações, embora isso não seja uma prática moral.
ConJur — Você falou de
representatividade, mas isso envolve negociação também.
Rosana Chiavassa — Óbvio. Até
porque há negociações dentro do próprio segmento. Você pega um segmento com
maioria trabalhista, que tem o grupo claramente dividido entre os que defendem
empregados, os que defendem empresas, os ligados a sindicatos, ligados a
partidos... É uma gama infinita dentro do próprio segmento. O amigo não pode
existir numa chapa. Tem que ter na chapa pessoas capazes, competentes e
representativas dos segmentos mais significativos. Se você é procurado por
segmentos que tem 80 advogados, o que é muito pouco para integrar a chapa, um
representante deles pode, sim, cuidar da comissão responsável por essa
representação. Eu tenho quase certeza que os demais candidatos também
estão falando sobre alianças o tempo inteiro. Falo com mais de 40 pessoas por
dia, de vários lugares, de várias representações. É um momento, já que a minha
campanha está na rua, onde as pessoas começam inclusive a te apresentar
advogados que querem conversar sobre determinados segmentos.
ConJur — Falar com
mais de 40 pessoas dia, ir para a rua fazer panfletagem e ainda dá tempo de
trabalhar?
Rosana Chiavassa — Tem que dar. Eu
estou chegando ao escritório às 6h. A gente está fazendo panfletagem, então eu
saio daqui 12h e a gente termina a panfletagem 16h30. Normalmente, há uma
reunião posterior. Eu chego em casa entre 20h e 21h. Aí vou para a esteira,
fazer musculação e ler meus livros.
ConJur — A senhora
gostaria de destacar algum apoio?
Rosana Chiavassa — O do professor
Fabio Comparato, do professor Sílvio Venosa e da família Cretella, que me
acompanha já há alguns anos.
ConJur — Qual é o
principal papel da OAB?
Rosana Chiavassa — A OAB tem dois
grandes papéis e que caminham juntos para chegar a um fim: a entidade não pode
deixar de defender e representar o advogado e, ao mesmo tempo, não pode deixar
de defender e proteger a sociedade. E, para mim, eles são muito interligados,
porque, a partir do momento em que você defende a sociedade, ela passa a
respeitar a figura do advogado, inequivocamente. É inadmissível que a OAB não
tome uma postura frente a essas campanhas televisivas de colocar o advogado
como o grande malandro, o grande solucionador por vias obliquas das questões.
Então, para mim, esses dois objetivos caminham em paralelo e acabam se
entrelaçando, eu acho que uma coisa depende da outra.
ConJur — A senhora diz
que é preciso defender a sociedade para que a sociedade passe a respeitar o advogado,
mas não seria melhor fortalecer o advogado para ele ganhar valor perante a
sociedade?
Rosana Chiavassa — São os dois.
Hoje você tem uma sociedade que não respeita o advogado e um advogado cansado e
cabisbaixo, porque ele não se sente respeitado, ele é vilipendiado até dentro
dos fóruns. É um círculo vicioso. O advogado está cabisbaixo, chega à noite em
casa e vê a figura de um bandido como seu representante na televisão, ele fica
desanimado. Aí o vizinho olha para ele torto, é um círculo vicioso.
ConJur — Quais são as
principais bandeiras da Ordem?
Rosana Chiavassa — Acho que passa
por esses dois mesmos caminhos. E depois vêm as bandeiras de como chegar a
isso. Temos que melhorar a imagem do advogado, com campanhas ofensivas. A OAB
gasta uma fortuna com mídia, e não se sabe onde estão essas campanhas
institucionais voltadas para a sociedade e para o advogado. Eu estou falando de
atividades concomitantes. São pequenos problemas do dia a dia do advogado
forense e que podem ser facilmente resolvidos. O fórum tem julgamentos de manhã
e a tarde. Normalmente as seções começam entre 9h30 e 10h30. As portas do fórum
ficam fechadas até às 9h, com os advogados formando filas enormes. Fazem
revista dos profissionais, que vão para a sala de julgamento. Chegando lá, é
preciso preencher um papelzinho com os dados do processo, achar o julgamento
numa pauta com seis, sete laudas, tudo com número pequeno. E eles
disponibilizam três pautas enquanto tem trinta advogados precisando consultar.
Paremos com isso, façamos como outros estados do Brasil, onde é possível se
inscrever para a sustentação oral pela internet, onde você sabe o número do seu
processo, qual é o número da pauta dele. São coisas pequenas, mas, para o
advogado que está atarefado, que tem chegar às 8h30 para ser o primeiro a
entrar, para ser o primeiro a entregar o seu papel, é insano. Isso é tão
fácil de resolver... Basta uma conversa com a presidência do Tribunal de
Justiça de São Paulo. Mas quem não conhece esse dia a dia do advogado, não sabe
falar sobre isso. Claro que tem grandes escritórios que conseguem mandar o
estagiário para passar pelo sofrimento e o advogado só chega às 10h.
ConJur — Isso seria a
bandeira das prerrogativas?
Rosana Chiavassa — Isso nem chega a
ser uma prerrogativa. São necessidades elementares do advogado forense. Se o
advogado tiver isso, é capaz até de diminuir a violação de prerrogativas. Ele
acaba sendo desrespeitado. Você tem que ir limpando o caminho e ficar só com as
grandes questões. Aí sim, entram a defesa das prerrogativas, a ética. Mas tem
que limpar a área, fazer o que é urgente. Junto a isso, temos que ver a Caixa
de Assistência dos Advogados de São Paulo. Eu acho fantástico termos farmácia,
remédios, ambulâncias, mas fica a pergunta maior: Para quê ambulância, se ele não
tem plano de saúde? Para quê remédio, se ele não consegue nem ir ao
médico? Em 2003, eu encontrei advogados no interior numa condição humana
muito triste. Em termos de vestimenta, de imagem, por dificuldade financeira,
óbvio. Isso não é mais uma prerrogativa do interior, isso está aqui, próximo a
nós. Talvez muitos advogados nem saibam que existe um ambulatório
odontológico na Caasp, onde ele é atendido e ele só paga o material. Não
adianta enfrentar as questões macro se o elementar não está sendo enfrentado.
Você não vai fazer esse advogado se sentir melhor discutindo só o [a desocupação do terreno de]
Pinheirinho, oferecendo só ambulância, eu acho que não estão ouvindo o
advogado.
ConJur — Como a
senhora vê o atual momento da Justiça, em que há aumento de poder de
fiscalização e investigação do CNJ?
Rosana Chiavassa — Acho fantástico,
o Brasil precisava disso. Há pessoas que merecem ser expulsas das corporações
às quais elas pertencem porque são pessoas imorais, que praticam atos ilegais,
por isso eu defendo também que na OAB tem que limpar a casa. Sempre falando
dessa minoria absoluta, que são poucos mas que realmente contaminam. Eu sou uma
árdua defensora dessas entidades. Claro que se percebe que tem um incômodo
inicial, mas pode ter certeza que daqui a dez anos ninguém vai ousar a falar
desse tipo de discussão. É que tudo que é novo assusta. Os magistrados
estão com medo, me parece uma situação que beira a teoria do caos. Tem muito a
se fazer, tem juízes a serem investigados. Não tem nada provado ainda contra
eles. Então não é para assustar. Agora se desses cerca de 500 que serão
investigados no Tribunal de Justiça de São Paulo, um ou dois, comprovadamente
forem condenados, que bom para a sociedade. Até porque, daqui a pouco, vão
achar que todo juiz, assim como acham do advogado, é malandro. É uma mentira
muito grande. Infelizmente o brasileiro ainda não está acostumado nem com
a informação e nem analisar a informação. A gente observa que o cidadão
brasileiro pega as coisas muito no ar, e dai faz uns julgamentos muitas vezes
errado.
ConJur — O CNJ deve
ser concorrente ou subsidiário às corregedorias locais?
Rosana Chiavassa — Concorrente. Eu
acho que as corregedorias fazem o que está nos regimentos internos, que é a
fiscalização. O CNJ também pode fazer. Muita coisa chega ao CNJ pelo cidadão. É
muito legal isso, porque qualquer cidadão hoje pode mostrar a sua irresignação
e obter uma prestação que ele não recebe via corregedoria, porque os
julgamentos nas corregedorias, em todos os estados são sigilosos. Se as
corregedorias divulgassem as suas punições talvez a sociedade não sentisse a
necessidade de ir para o CNJ.
ConJur — Divergências
sobre o CNJ criaram um conflito entre as associações de magistrados e a OAB.
Como a senhora vê essa questão?
Rosana Chiavassa — O pleito de
transparência é muito antigo no Brasil. Eu acho que a OAB tinha que ser mais
transparente. Até porque o dinheiro que ela arrecada chega a ser como o da
arrecadação pública. No orçamento da OAB que é disponibilizado, tem campos em
que eu, advogada, não sou afeta a analisar, queria que fosse mais transparente.
O dinheiro não é da OAB, o dinheiro é dos advogados. Eles teriam, sim, que ter
conhecimento daquilo, até para parar com essa discussão de algumas décadas de
que a anuidade é cara ou é barata. Não dá para saber, nós que estamos fora da
Ordem, porque falta essa transparência.
ConJur — E o conflito
da Ordem com os magistrados é uma coisa pontual?
Rosana Chiavassa — Isso que é
bonito do Direito. Não é só a OAB e os magistrados que entram em conflito. Eu
até entendo o posicionamento dos magistrados, se é uma minoria absoluta que
pratica atos contrários a legislação, eles têm que defender a categoria para
dizer: “Olha, nós não somos isso.” Tal qual a Ordem, no seu papel de defender a
sociedade, que dizer: “Não estou atacando todos os magistrados, mas nós estamos
querendo que aquele lá que vocês também querem que seja punido, seja.”
ConJur — Como a
senhora vê a Lei da Ficha Limpa?
Rosana Chiavassa — Tardia. Já
deveria estar decidido, definido, deveriam ter ousado em colocar em prática
imediatamente. A sociedade implora por esse processo de ficha limpa tal qual
implorou pela manutenção do CNJ. Nós não queremos atacar só o CNJ, nós estamos
querendo que essa moralidade invada o Brasil como um todo. Principalmente para
os candidatos.
ConJur — A Lei da
Ficha Limpa coloca a condenação em segundo grau como o fiel da balança. É
interessante a condenação em segundo grau ou seria melhor o trânsito em
julgado?
Rosana Chiavassa — Faltam
estatísticas. Infelizmente, o Judiciário não está apto a fornecer esses dados.
Quantos processos são revertidos em terceira instância? Quantas condenações são
revertidas? Não dá para responder prontamente isso. Se você me mostrar em um
levantamento real que 80% dos recursos para o Supremo Tribunal Federal ou
Superior Tribunal de Justiça são providos, eu diria que precisamos esperar.
Mas, se nós tivermos uma estatística mostrando que só 5% são acolhidos, eu
diria, não precisamos esperar. Aí vem o dilema do advogado. A pessoa tem o
direito do trânsito em julgado enquanto cidadão. Enquanto figura pública, o
direito mais importante é a sociedade não correr o risco de elegê-lo.
ConJur — Como está o
mercado de trabalho para o advogado em São Paulo?
Rosana Chiavassa — Achatado,
chapuletado, violado, diminuído desde 1995. E é o grande contrassenso, porque,
na Constituinte, conseguimos inserir o advogado no artigo 133 como
indispensável à Justiça. Em 1995, veio a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e
Criminais, onde o acusado pode se livrar do processo aceitando uma cesta
básica. A partir daquele momento, nós passamos a observar, e eu ouvi muito isso
de advogado, principalmente do interior, criminalistas. Isso é o aviltamento da
categoria. Muitas vezes, quando eu atuava na área criminal, era totalmente
contra esse acordo. Queria que meu cliente buscasse a absolvição. Por que ele
ia aceitar uma cesta básica correndo o risco de ter num próximo ato, num
próximo evento, todas as consequências que estavam no acordo? Se você tem
direito à defesa, porque você abre mão dele? Mas a coisa foi posta de tal forma
na sociedade que o sujeito prefere pagar uma cesta básica. É falta de
esclarecimento.
ConJur — As faculdades
estão formando cada vez mais. Como a senhora diz que mercado está se achatando?
Rosana Chiavassa — Eu diria que na
pirâmide, infelizmente, e a gente é obrigado a encarar essa realidade, você tem
5% da advocacia do estado de São Paulo que não tem problema algum financeiro,
ao contrário, estão muito bem, obrigada. É obvio que o mercado, para eles, está
muito aquecido. Os grandes escritórios que estão lidando com as fusões, por
exemplo, estão muito bem. O mercado de trabalho está muito complicado para quem
está nos 95%, no resto da pirâmide. No momento em que o Brasil é a sexta
economia mundo, como é que a advocacia está mal? Você tem o STF que diz que,
para ter acesso à assistência judiciária, a pessoa deverá ganhar até dez
salários mínimos. Para a realidade brasileira, é um valor muito alto. Essa
pessoa poderia pagar o advogado para aquela causa e desoneraria o Estado da
assistência judiciária. Você tem o cidadão que acha que não precisa de advogado
e vai sozinho no juizado, ai quando ele perde, ele vem procurar o advogado. Só
que já vem com o direito dele comprometido.
ConJur — O maior
acesso ao Judiciário é responsável por parte do problema do advogado?
Rosana Chiavassa — Se eu disser
isso, serei leviana. A prestação jurisdicional é direito da população
brasileira, que ainda não conhece todos os seus direitos. O que me deixa
indignada é o direito deste cidadão ir ao Judiciário comprometido, porque ele
estará sem a presença daquele que pode lhe defender e fazer o seu direito ser
realmente resgatado. Nós temos 18 milhões de ações por ano no Brasil
ajuizadas na Justiça estadual, retirando tudo o que se refere a governo
federal. Para medir o quanto disso emprega advogados, o quanto disso é juizado
especial, faltam dados.
ConJur — A atuação da
Defensoria Pública deve ser restringida, como forma de reserva de mercado?
Rosana Chiavassa — O único estado do
Brasil que não tinha Defensoria Pública era São Paulo. Quando eu era
conselheira federal da OAB, já existia, há anos, a Associação dos Defensores
Públicos do Brasil. É claro que São Paulo é um mundo à parte, pela quantidade
de pessoas e de advogados. Agora eu acho que não se volta mais atrás. A
Defensoria está aí, seguindo o modelo da Federação. Ela também não dá conta de
todas as demandas. O custo para o Estado pagar o que o defensor ganha é muito
alto. O Estado não tem como bancar uma Defensoria com o tamanho que ela
precisaria ter para tomar conta de toda a função dela. Nós nunca teremos a
Defensoria cuidando de tudo, é inviável, impraticável para o governo. Por isso,
é melhor assistência judiciaria, porque ele gasta menos. Hoje, presenciamos uma
briga da Defensoria Pública com a assistência judiciaria. Isso é uma vergonha.
Vamos equacionar, vamos resolver isso. Não se pode admitir, também, a
fiscalização técnica do advogado que presta assistência judiciária. Se ele já é
advogado, já tem carteira da OAB, eu acho inadmissível que “deem nota” para o
trabalho dele. Eu também não posso aceitar algumas idiossincrasias da
assistência judiciária. Por exemplo, está lá na tabela que a defesa criminal
custa R$ 2 mil. E aí, divide-se esses R$ 2 mil pelas instâncias. Sentença,
recurso, se o advogado tiver que apelar... Nesse momento ele recebe uma parte,
depois da apelação, outra. Se o cliente for absolvido já na sentença, não vai
ganhar os valores devidos por recursos, por exemplo. Então, seria melhor ele
trabalhar mal para condenar o cliente e receber mais.
ConJur — O quinto
constitucional deve ser revisto?
Rosana Chiavassa — O quinto sempre
foi um orgulho para a OAB, porque ele inseria dentro dos tribunais pessoas
capazes, com história. O que está por trás do quinto é oxigenar o tribunal com
a mente do advogado que sempre é mais abrangente. O papel do advogado é criar,
é construir. O do juiz é pegar tudo pronto e julgar. A Constituição faz essa
interligação para ajudar. Agora, se a coisa se desvirtuou desse princípio,
desse sentimento, dessa vontade que o instituiu o quinto então é claro que tem
que ser revisto. Eu não estou lá dentro, então eu não quero falar levianamente,
porque é óbvio que o presidente da OAB e o presidente do tribunal e claro, seus
conselheiros, têm uma conversa mais aberta com a cúpula do tribunal para saber
exatamente o que está acontecendo. Eu não estou participando desses concursos,
dessas negociações, dessas conversas para poder falar além do que já falei.
Agora, existir advogado eleito pelo quinto que não recebe advogados em seu
gabinete é demais para a minha cabeça.
ConJur — Formas
extrajudiciais para resolução de conflito. É interessante para o advogado e
para a OAB?
Rosana Chiavassa — Eu acho que, se
o advogado estiver inserido, óbvio que é. Eu faço parte da comissão de revisão
do Código de Defesa do Consumidor pelo Instituto dos Advogados do Brasil e eu
conversei sobre a possibilidade de que se dê mais poder ao Procon, inclusive
com o Procon proferindo decisões que serão só executadas no Judiciário. O
consumidor ganharia mais tempo. Acho fantástico, desde que tenha a presença do
advogado, sempre. Não interessa se é Justiça, se é tribunal de arbitragem,
o que é. Tem que ter a presença do advogado. O advogado é indispensável em
qualquer solução de conflito, seja o muro do vizinho, seja uma grande fusão,
uma incorporação, enfim.
ConJur — A frequência
com que advogados da União se tornam ministros do STJ e do STF é interessante?
Rosana Chiavassa — Se está havendo
uma predominância disso ou daquilo, acho que cabe à OAB ver isso também. A OAB,
porém, tem o limite dela, que esbarra no chefe de governo. Ele vai nomear quem
ele quiser. E talvez aí haja uma tendência de privilegiar, não privilegiar, de
comungar interesses. Eu acho que a OAB tem que estar próxima a isso para exigir
talvez a isonomia. O papel da OAB é intervir em tudo em prol da Constituição
Federal.
ConJur — Advogado
público deve receber honorários e sucumbência?
Rosana Chiavassa — Sim. Receber honorários é um direito inquestionável do advogado. Eu acho que não afeta o erário, porque não é um dinheiro que vem do orçamento do governo, é um dinheiro que é pago pela parte contrária. Não tem porque o governo se apropriar disso, que decorre do trabalho do advogado.
Rosana Chiavassa — Sim. Receber honorários é um direito inquestionável do advogado. Eu acho que não afeta o erário, porque não é um dinheiro que vem do orçamento do governo, é um dinheiro que é pago pela parte contrária. Não tem porque o governo se apropriar disso, que decorre do trabalho do advogado.
ConJur — O Exame de
Ordem tem um nível adequado para a advocacia?
Rosana Chiavassa — Está na hora
de a OAB reformular isso e começar a avaliar o estudante desde o primeiro ano
da faculdade, de acordo com o currículo. Vai ter notas ano a ano, conseguindo
até avaliar a faculdade. Não dá para dizer está fácil ou difícil. O que eu
posso lhe dizer é que hoje alguns advogados não passariam no Exame de Ordem.
Essa é uma realidade, então vamos ver o que está acontecendo. Eu não acredito
nessas pesquisas que são dadas, porque você não tem o dado correto, só a nota
na prova, misturando as faculdades que inscreveram cinco e as que inscreveram 3
mil estudantes. Induz-se aquele jovem que está se inscrevendo no vestibular a
procurar determinadas faculdades induzidos em erro por essas pesquisas.
ConJur — A senhora é
favorável às eleições diretas para o Conselho Federal da OAB?
Rosana Chiavassa — Eu já estive lá
no Conselho Federal. É difícil responder, porque eu não sei se há um preparo
para isso. A gente sabe que, infelizmente, muitos advogados chegam no dia da
eleição e votam em qualquer um, sem analisar os candidatos. É aquele processo
da cidadania mesmo, do modelo Brasil, infelizmente. Acho que não seria essa a
hora de permitir uma disputa aberta no Conselho Federal, mas eu acho que o
caminho seria esse daqui a um tempo. Você tem que, primeiro, fazer o advogado
se sentir importante, participar, discutir, conscientizá-lo sobre o papel da
OAB. Não pode demorar muito.
ConJur — Quem são seus
maiores ídolos no Direito?
Rosana Chiavassa — Fábio Comparato,
que eu considero um dos maiores filósofos do Direito do Brasil, José Ignácio
Botelho Mesquita, que é meu ídolo como homem, em Processo Civil, Cláudia Lima
Marques, que é uma figura fantástica, foi a primeira jurista mulher a falar em
Haia, Miguel Reale, que é uma grande cabeça, e Silvia Pimentel, que é o exemplo
da mulher advogada e hoje está na ONU representando o Brasil.
ConJur — Pontualmente,
qual o maior problema da Justiça brasileira?
Rosana Chiavassa — Falta de
estrutura para dar andamento à demanda. Não adianta matar o doente com essas
reformas de processo se não matar a causa. A causa da doença do Judiciário é a
falta de estrutura. Ponham-se mais juízes e funcionários. Priorize-se por meta
os processos da Fazenda Pública. Se 70% dos processos são ações do governo,
vamos esvaziar o Judiciário tirando essa demanda de lá.
ConJur — Os tribunais
de ética da Ordem funcionam como deveriam?
Rosana Chiavassa — Eu diria que
sim. São advogados abnegados que estão lá, não estão atrás de cargo nem de
cartãozinho com o símbolo da Ordem, pois realmente nada recebem por isso. Tem
que, talvez, dar um jeito de acelerar o processo.
ConJur — O trabalho da
OAB de São Paulo precisa de continuidade ou mudança?
Rosana Chiavassa — Dos dois. A
diferença é que o que está implementado e dando resultado, vamos manter. E o
que já está estratificado de forma negativa, tem que mudar, tem que renovar,
tem que virar a página correndo.
ConJur — A senhora é
especialista em Direito do Consumidor. Como isso pode auxiliar na presidência
da OAB?
Rosana Chiavassa — O meu dia a dia
é a defesa do menos poderoso.
ConJur — Vai votar no
D’Urso para prefeito?
Rosana Chiavassa — Eu não tenho
nada contra a pessoa dele, mas eu já tenho o meu candidato a prefeito, que não
é o atual presidente da OAB.
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